Renascimento do futebol italiano
- Comunica Uerj
- 21 de mai.
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Após escândalos de corrupção, crises financeiras e falências, times italianos ressurgem no cenário europeu
Por: João Pedro Serafim Alves
Foto: Freepik

Outrora uma grande potência global, dona de quatro títulos mundiais e um celeiro de craques como Francesco Totti, Roberto Baggio, Alessandro Del Piero e Paolo Maldini, a Itália atravessou uma profunda crise identitária na década de 2010. Clubes tradicionais, como Inter de Milão, Roma e Milan, mergulharam em um período de ostracismo, marcado por crises financeiras, eliminações precoces em palcos europeus e um campeonato sem competitividade, devido à hegemonia da Juventus. Entretanto, o cenário tem mudado nos últimos anos, com um ressurgimento dos times italianos, que estão voltando a ter protagonismo na Europa.
Declínio: escândalo, mecenato e fair play financeiro
Durante a década de 2000, a Série A era protagonista no cenário europeu, atraindo os melhores atletas do mundo e contando com times fortes nas competições continentais. Porém, o escândalo do Calciopoli, que expôs um grande esquema de manipulação de resultados envolvendo clubes como Juventus, Milan e Lazio, abalou a confiança dos fãs na credibilidade da liga. Essa investigação, que durou de 2004 a 2006, gerou impactos tanto na esfera esportiva, com a perda do título da Velha Senhora e seu rebaixamento à Série B, quanto na financeira, com a revisão de contratos e investimentos de patrocinadores que não queriam ter seu nome atrelado ao escândalo. O impacto financeiro foi tão forte que, de acordo com a Deloitte, consultoria que realizou estudos sobre saúde financeira no futebol, a Série A apenas conseguiu recuperar o seu valor de mercado pré-Calciopoli após cinco anos, em 2011. Ao mesmo tempo a liga observava um forte crescimento comercial das ligas concorrentes que ocupariam o protagonismo europeu, a Premier League e La Liga.
A crise financeira de 2008 causada pelo colapso imobiliário nos EUA e que afetou a economia global agravou ainda mais a situação. No futebol, isso resultou na redução de investimentos em patrocínios e queda no poder de compra dos torcedores, impactando diretamente nas receitas dos clubes. Somado a isso, a aplicação do fair play financeiro pela Uefa em 2010, que exigia equilíbrio financeiro, limitando o quanto os mecenas podiam investir em seus clubes, afastou empresários como Silvio Berlusconi, que investia sua fortuna pessoal no clube para equilibrar as contas e cobrir déficits. Assim muitos clubes italianos, endividados, foram enfraquecidos.
Ressurgimento: nova lei fiscal e mudanças táticas
Após quase uma década no ostracismo, o futebol italiano está ressurgindo. A Inter de Milão, é a atual finalista da Liga dos Campeões 2024/25, feito não tão fora da curva, já que os Nerazzurri também tinham chegado na final da edição 2022/23, a Atalanta, campeã da Liga Europa em 2023/24, e clubes como Roma, Milan e Napoli, que avançaram em competições continentais, demonstram essa mudança. Esse sucesso reflete o fortalecimento financeiro que a liga viveu. Uma lei sancionada em 2018 trouxe incentivos fiscais para que atletas e técnicos se fixassem no país, o que fez com que os clubes gastassem menos com impostos e pudessem pagar salários mais atraentes. Com isso, o Calcio voltou a atrair nomes de peso, como Cristiano Ronaldo, que elevaram o nível técnico do campeonato.
Claro que não se deve esquecer que parte dessa renovação também passa por uma transformação tática. O velho estereótipo que a Itália possuía, chamado de catenaccio, estilo baseado numa defesa forte e jogos de poucos gols, ficou no passado. Hoje, os clubes da Série A apostam em uma zaga forte, mas também num estilo mais ofensivo e dinâmico. A Atalanta de Gian Piero Gasperini é o maior símbolo dessa mudança. Com um futebol envolvente e alta média de gols, o time de Bérgamo conquistou os olhares atentos de apreciadores de um bom espetáculo, desafiando a hegemonia da Juventus. A alternância de campeões nas últimas três temporadas com Inter, Milan e Napoli, interrompendo a hegemonia da Velha Senhora, reforça que de fato os clubes italianos têm voltado a competir.
O ressurgimento do futebol italiano trouxe de volta a competitividade do Calcio. Clássicos como o Derby della Madonnina, entre Inter e Milan, reacendem a paixão dos torcedores, trazendo memórias de um passado distante estrelado por lendas como Wesley Sneijder, Diego Milito, Ronaldinho e Clarence Seedorf. Com clubes competitivos, um futebol mais ofensivo e uma nova safra de talentos, o Calcio pode recuperar seu lugar como protagonista no Velho Continente.
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