Alunas da graduação contam as dificuldades de conciliar filhos com a rotina de estudos e os desafios impostos pelo ambiente acadêmico
Por Richard Gabriel Redatora: Maria Eduarda Galdino
Foto: Beatriz Moreira
Mãe e filho em frente ao Campus Maracanã
Conciliar a maternidade com a rotina da universidade não é uma tarefa fácil. Para as universitárias que vivem essa condição, manter-se nos estudos se torna um desafio. Essa é a realidade de muitas estudantes da Uerj, como a de Hilary Valim, 23 anos, moradora da Zona Oeste do Rio, mãe de um menino de 1 ano e 10 meses e estudante de Pedagogia na Uerj. Para ela, a universidade não está preparada para aceitar crianças em um ambiente planejado apenas para adultos. “Desde a gravidez eu já imaginava o quão difícil seria enfrentar uma universidade sendo mãe, porque convenhamos, não é um lugar pensado para uma garota pobre, da Zona Oeste do Rio e mãe. Esse é um ambiente que precisa ser mais inclusivo, porque se é um local que exige presença, pontualidade, e é um espaço para pais, ela também precisa ser um espaço para os filhos.”
A maternidade durante a graduação exige mudanças na rotina das estudantes, que enfrentam diversos obstáculos em busca do diploma. Beatriz Moreira, 24 anos, estudante de Pedagogia na Uerj desde 2018, teve seu filho, Lucas, em 2021, durante o período de aulas remotas, e conta ter conseguido conciliar a maternidade com a graduação durante o período on-line. De volta ao presencial em 2022, ela diz ter passado por uma grande dificuldade por ter que levar o filho de então 1 ano às aulas, e que nem todos os professores foram compreensivos. “As vezes sinto que alguns docentes não fazem ideia do esforço que é estar no ambiente de faculdade, sendo mãe de filho pequeno e ainda trabalhar, que é o meu caso. Mas graças ao apoio de alguns colegas e da minha família isso não impediu que eu voltasse e me dedicasse a acabar o curso.”
O auxílio-creche no valor de R$ 900 por criança, implementado na Uerj como Ato de Decisão Administrativa (Aeda), é pago aos estudantes matriculados com filhos entre 0 e 7 anos incompletos e é efetivado por meio de repasses de recursos financeiros que visam a subsidiar as estudantes mães enquanto estão dedicadas às atividades acadêmicas. Porém, como o auxílio não é um decreto do Estado, não é garantido e sofre recorrentes atrasos. “O auxílio creche, que parecia ser revolucionário, acabou se tornando uma dor de cabeça. Toda vez que atrasa acaba nos colocando em uma situação de vulnerabilidade, já que eu dependo dele para conseguir estudar enquanto meu filho está na creche”, conta Hillary.
O auxílio não é a única questão, já que a Uerj ainda não disponibiliza, por exemplo, trocadores em todos os andares, como aponta Hilary. “Já tive que trocar meu filho no centro acadêmico, e foi algo super desconfortável, porque eu não quero que outras pessoas, principalmente homens, olhem as partes íntimas dele. E não é porque estou acusando alguém, mas não estamos no coração das pessoas.”
À batalha de todo dia para cumprir as inúmeras tarefas soma-se o constrangimento que muitas vezes as alunas enfrentam em seu cotidiano, como nos relata Beatriz: “Na minha primeira aula de matemática, eu levei meu filho. Como de costume, todos os alunos estavam falando junto com a professora e meu filho estava quieto. Ele em um certo momento deu um grito, e a professora pediu pra ele fazer silêncio. Fiquei chateada porque quando os adultos estavam falando, a professora não se manifestou, mas quando foi um bebê, ela resolveu reclamar. Ele então ficou triste e começou a chorar depois da bronca que ela deu nele, e eu peguei os meus pertences, saí da sala e também comecei a chorar. Com isso, eu cancelei a disciplina e me afastei das outras aulas por 1 mês, por medo de acontecer o mesmo.”
Desde 1975 a licença maternidade garante os direitos das estudantes brasileiras caso engravidem durante o período em que estão matriculadas em instituições de ensino. Porém, essa medida é insuficiente para a maioria delas. Muitas buscam apoio em coletivos e em programas de assistência estudantil, como é o caso do grupo Aldeia, parte do projeto chamado Acesso e Permanência de Mães na Universidade, promovido pelo Departamento de Acolhida, Saúde Psicossocial e Bem-estar (Daspb), ligado a PR-4/Uerj. O grupo é uma ação de acolhimento e de assistência direta aberta que começou em abril de 2023 e acontece todo mês alternadamente entre segundas de manhã e quartas à tarde. “O Aldeia é um grupo de trocas de experiência e apoio mútuo entre essas mães em que a gente traz dinâmicas que ajudam elas a refletirem, questionarem e falarem sobre questões que atravessam a maternidade e a vida acadêmica” conta Aline Passeri, psicóloga do Daspb.
Segundo Aline, muitas vezes essas docentes ficam sozinhas nos cursos e não conseguem acompanhar a turma em que entraram, devido aos cuidados necessários com os filhos. “Dentro do Aldeia elas acabam se sentindo pertencentes à universidade. Elas se veem entre pares, conhecem outras mães na mesma situação que elas, formam redes de apoio e se fortalecem como coletivo.” O projeto também é inclusivo para crianças, tendo sempre uma brinquedoteca e alguém da equipe no apoio às crianças.
Além do Aldeia, o Projeto Acesso e Permanência de Mães na Universidade está coletando dados para levantar o perfil das estudantes mães da Uerj e a partir deles buscar formular políticas de acesso e permanência. Para participar basta preencher o formulário link do formulário que está aceitando respostas até Julho de 2024.
Para acompanhar o calendário de encontros do grupo Aldeia, siga o Daspb no Instagram @daspb_uerj ou acompanhe no site da PR-4.
Foto: Hilary Valim
Bebê na placa Eu Amo Uerj
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