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Maior nocaute da noite não foi em Wanderlei Silva

  • Foto do escritor: Comunica Uerj
    Comunica Uerj
  • 7 de out.
  • 3 min de leitura

Spaten Fight Night recoloca artes marciais em destaque, mas o preço pode ser alto


Por Luis Felipe


Foto: Divulgação

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Popó e Wanderlei Silva se encaram uma última vez antes da luta




Já se passaram quase 15 anos desde a última vez em que o brasileiro médio comentou tanto sobre um evento relacionado ao mundo das lutas. Rivalidades históricas do início da década de 2010, como as que envolviam um dos maiores lutadores de todos os tempos — Anderson Silva contra Vitor Belfort e Chael Sonnen —, eram constantemente debatidas em mesas de bar, padarias e outros espaços do cotidiano. Entretanto, ao abrir as redes sociais no dia seguinte ao recente evento, não era o esporte que estava sendo celebrado — e sim a selvageria que, por tanto tempo, tentou ser afastada da imagem dos lutadores.


No último sábado (27), ocorreu a segunda edição da Spaten Fight Night, a qual contou com grandes nomes do pugilismo e das artes marciais mistas. A atração principal da noite seria a reedição de uma luta histórica entre Wanderlei Silva e Vitor Belfort no ringue montado pela cervejaria. Porém, após a lesão de Belfort, o ex-campeão mundial de boxe e ícone brasileiro Acelino “Popó” Freitas entrou no card para salvar a noite — ou participar do enterro da reputação das artes marciais.


A imagem de Wanderlei Silva, ex-lutador de quase 50 anos — que já havia revelado em entrevista apresentar sinais claros de danos cerebrais provenientes das pancadas acumuladas em sua carreira —, nocauteado sob a logo da Spaten, após uma briga generalizada entre as equipes de ambos os lutadores, rodou o mundo e, para minha surpresa, foi amplamente celebrada nas redes. Internautas encheram os comentários de comparações com a confusão nas arquibancadas no jogo entre Vasco e Athletico Paranaense, em 2013, evidenciando que só comemora essa situação quem não compreende o que é o esporte — nem o impacto que isso pode gerar em um meio já tão estigmatizado.


Em entrevista ao COMUNICA, o ex-atleta faixa-preta de Muay Thai e treinador de boxe Flávio Farias comentou sobre a associação equivocada da agressividade com os praticantes e profissionais de lutas. Treinando desde criança, Flávio se inspirou nesse julgamento social para se formar em Educação Física e promover uma outra visão do esporte em diferentes contextos, mostrando que as artes marciais vão muito além do que a sociedade imagina.


Indagado sobre qual seria o lema dos esportes de combate, o ex-atleta reforçou o afastamento do estereótipo e acrescentou os valores realmente compartilhados, como uma filosofia de vida pautada em disciplina, respeito e autocontrole — algo presente desde cedo, com o ensinamento de que a luta não é contra o outro, mas contra si próprio. Flávio também pontua o ocorrido no último sábado e suas possíveis consequências: “O problema é quando alguns atletas, que são referências para tanta gente, acabam se envolvendo em brigas fora do contexto esportivo. Isso não prejudica só a carreira individual deles, mas coloca em risco todo o legado que as artes marciais construíram ao longo dos anos, de que são um caminho de cidadania, de disciplina e de superação”, comenta Flávio.


Por fim, surge em mim, que, além de colunista, sou atleta de Karatê, outro questionamento: qual o limite das pessoas nos dias atuais? O acesso a conteúdos gore — termo atrelado a imagens de violência extrema — está cada vez mais facilitado e presente no mainstream, o que parece ter gerado um aumento da tolerância dos espectadores ao absurdo.


A confusão trouxe uma visibilidade que há muitos anos não se via, mas será mesmo que é esse o público que o mundo das artes marciais quer atingir? Pessoas que esperam cada vez mais imagens tristes, como a de uma lenda do esporte estirada ao chão depois de levar um soco enquanto tentava apartar uma briga — tudo em nome do entretenimento?


Do ponto de vista de uma marca de bebida alcoólica, será que é interessante para a Spaten se associar a episódios de violência desmedida, ainda mais diante da conhecida relação entre álcool e agressividade?


O maior nocaute da noite não foi o de Wanderlei Silva. A reputação do universo das lutas pode estar novamente se atrelando ao brutal, à barbárie. Uma construção que levou anos para ser erguida caiu junto com aquele brasileiro no centro do ringue para todo o mundo ver — e só está feliz quem não vive na pele as consequências de ser marginalizado por lutar e acompanhar as artes marciais.



1 comentário


Clara Motta
Clara Motta
08 de out.

Eita que situação chata para o mindinho das lutas.

Equipe de marketing da spaten vai ter que trabalhar muito

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