Mesmo sendo alvo constante de ataques, a aldeia sobrevive e acumula história de resistência
Olhando rapidamente, a Aldeia Marakanã aparenta calmaria e tranquilidade, porém, olhando mais a fundo, a história resgata um local de disputa e resistência, em meio ao território de um dos bairros mais famosos da Zona Norte carioca.
Na entrada, há vendedores de peças de artesanato da cultura tradicional. Adentrando o local, casas simples e barracas de camping servem de morada. Também há espaços comunais para reuniões e celebrações, ambientes abertos para diversão das crianças e plantações de alimentos.
Desde 2004, indígenas de várias etnias se esforçam na tentativa de ocupar o território, mantendo sua cultura e tradições vivas. Por outro lado, o poder público busca o despejo deles para continuar a expansão imobiliária na região do Maracanã.
O cacique José Urutau Guajajara, líder dos indígenas que ocupam a Aldeia Marakanã, está há cerca de 15 anos lutando pelo direito de viver no local. Ao conversar com José, os relatos sobre a ocupação se tornam ainda mais vívidos. Marcante na história recente da cidade do Rio de Janeiro, o ano de 2013 também será lembrado pela Aldeia Marakanã, porém, de forma não tão feliz.
Após seis anos habitando o espaço, os indígenas que ali se faziam presente foram removidos pelas forças de segurança do governo estadual. Segundo José, tal medida se deu pela especulação imobiliária, tendo em vista, o interesse crescente na região do Maracanã durante os anos de 2013, 2014 e 2016, que correspondem respectivamente aos anos de realização dos megaeventos esportivos na cidade do Rio, como a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e as Olímpiadas.
Mais recentemente, em 2018 e, novamente, em 2020, a Aldeia Marakanã sofreu novas ameaças de despejo e invasão. Rodrigo Amorim (PTB), Alexandre Knoploch (PSC), deputados estaduais eleitos pelo Rio de Janeiro, e Daniel Silveira (PTB), ex-deputado federal fluminense, foram algumas das visitas. O próprio cacique comenta que eles iam atacar verbalmente os indígenas, acusando-os de serem um “lixo urbano”. Para evitar a visita desagradável, um muro foi construído. José entende que ainda é uma forma de defesa precária.
Durante a pandemia, a Aldeia Marakanã também foi um foco de resistência, dessa vez, contra a Covid-19. O cacique afirma que não houve casos da doença. Ele também reconheceu o papel fundamental dos profissionais da saúde que se mobilizaram para ajudar na vacinação, na doação de máscaras e na alimentação. Ainda segundo José, outras aldeias pelo Brasil sofreram com a enfermidade, o que ressalta o êxito no trabalho feito na sua aldeia.
Em uma rápida visita, o que mais chama a atenção é um prédio: a Universidade Indígena Aldeia Marakanã, o antigo Museu do Índio. O edifício está no local desde 1910, mas até hoje não foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). José mostra os problemas estruturais e goteiras, apontando também para os traços arquitetônicos da construção. Ele, ex-doutorando da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), argumenta que mais alunos da universidade deveriam ir lá. O intercâmbio seria proveitoso para todos os lados. O próprio é professor de línguas e cultura tupi-guarani e de cantos tradicionais.
Apesar de participar de algumas iniciativas, como o evento do Uerj Sem Muros, José entende que é muito pouco: “Essa ausência enfraquece a causa. Sem a presença de alunos e pesquisadores da Uerj, sendo ela tão próxima da Aldeia, parece que não há nada para se pesquisar na área. O que fortalece o argumento pelo desalojamento dos indígenas moradores da Aldeia”, afirma o cacique. Sendo um lugar de constante luta e resistência, a ocupação toma muito tempo de José. Ainda assim, ele tem interesse em voltar para a Uerj, mas as batalhas pela sua moradia estão longe de acabar.
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