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  • Foto do escritorCaroline Rocha

Aluna sofre feminicídio e Uerj fecha os olhos

Atualizado: 4 de fev. de 2023

Estudante de Ciências Contábeis foi asfixiada pelo ex-marido


Foi difícil segurar o choro enquanto ouvia os relatos de um pai dias após saber do assassinato da própria filha. Morta por asfixia pelo ex-marido no dia 2 de janeiro, Gabriela Silva de Souza, de 27 anos, era aluna de Ciências Contábeis na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Um feminicídio brutal como esse deveria, no mínimo, ter gerado comoção em toda a universidade. Mas o caso pouco foi comentado depois do dia do ocorrido. 


Foto: Reprodução

Gabriela Silva de Souza, aluna de Ciências Contábeis na Uerj


A pequena mobilização sobre um crime tão horroroso em uma universidade com mais de 40 mil alunos e cerca de 2 mil professores revela muito sobre o ambiente que estamos construindo. 


Logo após saber da notícia, entrei em contato com Arnaldo, pai de Gabriela, para tentar entender melhor o acontecido e colocar na Super Rádio Tupi, onde trabalho, um possível desdobramento do caso. O crime foi veiculado nos principais jornais brasileiros, mas eu sentia que tinha algo sendo deixado para trás. 


Enquanto ainda estava trocando mensagens com Arnaldo, comentei com algumas pessoas sobre o caso que investigava e percebi que o que eu sentia falta era mais óbvio do que pensei: faltava repercussão. Não nas grandes mídias, mas no lugar que Gabriela dedicou seus dias e apostou seu futuro.


Me lembro de sentir meu corpo gelar ao ouvir Arnaldo contar sobre o reconhecimento do corpo da filha. Detalhes sobre os machucados nas pernas da jovem, a rotina de agressões que sofria e os relatos dos netos geraram um misto de tristeza, raiva e empatia.


Gabriela era mãe de dois meninos, um de quatro e outro de dois anos. Eles ainda não sabem sobre a morte dela.  “Papai deu um tapa na cara da minha mãe”, uma vez disse um deles. Em outro episódio, um dos bebês saiu de casa gritando, pedindo para Fábio não bater em Gabriela. 


A rotina de agressões era conhecida por todos. Amigos e família afirmam que tentavam avisá-la, mas ela não queria que os filhos crescessem sem o pai. “Esse foi o grande erro dela”, disse Arnaldo. Após a descoberta, em novembro, de uma traição, ela pediu a separação. O casal estava junto há mais de três anos.


Fábio Araújo da Silva assassinou a jovem no dia em que prometeu deixar a casa onde moravam, no quintal de Arnaldo. Segundo o sogro, ele teria até janeiro para arrumar um novo local para ficar. Após o crime em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, Fábio pegou os dois filhos e os levou para a casa da mãe dele, em Brás de Pina, na Zona Norte do Rio. E depois, se entregou à 38ª DP.


Foto: Reprodução

Fábio Araújo da Silva, assassino confesso de Gabriela


“O policial me abraçou e disse: ‘Você precisa ser forte’. Minhas pernas começaram a bambear. Meu mundo caiu”, contou o pai com a voz embargada sobre o momento em que recebeu a notícia. Na manhã do dia 2 de janeiro, amigos da Uerj ligaram para a jovem perguntando se ela iria para aula, conta o pai. Com ciúmes, Fábio pediu o telefone e Gabriela negou. E então “ele deu um mata leão nela.” 


Eu pensei em não detalhar o crime por ser muito chocante. Mas repensei, e o objetivo passou a ser de fato chocar. Talvez dando de cara com a realidade, um caso tão tenebroso como esse vire pauta nos corredores da universidade. Se saber que uma mulher foi enforcada pelo ex-marido não foi o suficiente para que a gente começasse a se mover, talvez sabendo como isso destruiu uma família, a Uerj seja balançada.


Por que não estamos discutindo como criar um ambiente saudável na universidade para que outras mulheres sintam-se confortáveis para denunciar? Por que achamos comum que matem nossas amigas, tias, mães…? Por que os homens que nos maltratam não são culpabilizados?


Por que não estamos cobrando os homens que frequentam o campus para que eles sejam respeitosos? Por que nós, enquanto comunidade, não respeitamos a história de Gabriela? Por que aceitamos que ela fosse largada no esquecimento? 


Talvez as respostas para tantos porquês garantissem que Gabriela fosse a última. Mas a falta de disponibilidade para responder a tantas perguntas permitiu que ela, infelizmente, fosse mais uma.

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