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A ignorância dos homens

Atualizado: 25 de out. de 2023


Ilustração: Guffo


Por Giovanna Guitarrari



Tem uma padaria na esquina da minha casa, dispenso dizer que é cara, como toda padaria, mas serve para comprar um pão francês ou dois. Eu estava na fila da bancada para pedir o pão quando um menino se aproximou, devia ter uns 12 anos, estava bem-vestido, mas visivelmente sujo, descalço, e com algumas balas na mão, abordou o senhor que estava na minha frente.


— Compra um pão pra mim, tio. Eu tô com…


E antes que o garoto pudesse terminar o pedido, a voz irritada do homem tomou espaço.


— Não me peça nada, não! Não vou dar nada pra você, não adianta pedir! Por que você não vai trabalhar? Se fosse trabalhar não ficaria aí mendigando igual preguiçoso!


O menino deu um passo para trás com uma careta estranha, eu estava perplexa, acho que ninguém na fila esperava tamanha reação, ainda mais de um senhor de idade.


— Garoto!


Um homem no canto da padaria com um bolo na mão chamou a atenção, encarava o idoso.


— Pega o que você quiser e me traz, eu pago.


Logo em seguida o menino pediu o pão e pegou um bolo pequeno de chocolate no corredor, com um sorriso brincalhão deslumbrante, não demorou muito para sair do estabelecimento comendo um pedacinho de pão e a sacola na mão.


Sigo me perguntando desde quando acabaram com a inocência das crianças e se acostumaram à ignorância dos homens. Afinal o que impressionou não foi um garoto de 12 anos pedindo comida, mas sim a atitude exageradamente irritada de um senhor. Não vão medir as suas palavras, seja por ele ser de idade, ou pelo seu pensamento corresponder à mentalidade de grande parte do Brasil, oferecer o trabalho infantil como uma solução lógica não choca ninguém, assim como uma criança na rua com fome não choca ninguém. Sabe o que eu fazia com 12 anos? Me lembro de ir ao parquinho da praça perto de casa e subir em tudo que via pela frente, encher o saco da minha mãe para comprar picolé e ficar descalça apenas para brincar. Obviamente cada um tem sua própria experiência de infância, mas a inocência deveria estar presente em todas elas. Não apenas quando se escolhe um bolinho de chocolate.


Um tempo depois, já na fila para pagar, percebi que o idoso estava destratando também a moça do caixa, confesso que até agora não entendo como um homem de tanta idade é tão impaciente.

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